Wevergton Lima: As eleições do Vasco e o velho Aristóteles

À medida que se aproximam as eleições do Vasco (embora alguns queiram jogá-las para as calendas gregas) sobe entre os vascaínos o tom da disputa. Vascaínos que se abraçariam nas arquibancadas a um gol do Vasco, passam a tratar uns aos outros com um ódio mortal, só dedicado aos piores inimigos, no caso de discordância sobre a melhor opção nas eleições. Na internet então, nem se fala.

Por Wevergton Brito Lima*

Quem se aventura a arriscar uma opinião nas redes sociais corre o risco de ver a própria mãe sendo acusada de práticas condenadas pela moral vigente. Discussão sobre programas e propostas é o que menos se vê.

Este fenômeno até certo ponto é desculpável pela enorme paixão que cerca tudo que diz respeito ao Vasco. Mas existe um discurso que deve ser objeto de reflexão, é o que diz que não se deve apoiar, para presidente do Vasco, candidatos “políticos”.

Essa afirmação traz, em si mesma, grandes contradições. Em primeiro lugar, parte da definição de que todo “político” é, sem exceção, ruim. Assim, quem defende este ponto de vista não votaria em Nelson Mandela (dirigente partidário e mais tarde presidente eleito de seu país), Gandhi (fundador do “Congresso Hindu” e do moderno estado indiano), Jorge Amado (deputado constituinte em 1946), Pablo Neruda (senador), etc, caso estes ilustres personagens quisessem ser presidentes do Vasco. Não votariam inclusive naquele que é considerado por muitos o maior presidente da história do Vasco, Cyro Aranha, formador do expresso da vitória. Cyro Aranha era político getulista, irmão do ministro do exterior Oswaldo Aranha. Quando era vice-presidente do Vasco em 1945 chegou a renunciar revoltado com a reação de certos sócios contra o comício que o Partido Comunista do Brasil organizou em São Januário em torno de Luís Carlos Prestes, comício que ele e o então presidente Castro Filho tinham autorizado.

Mas o maior problema da consigna que diz “não voto em políticos” não é esse, é que ela traz em si uma grande dificuldade, que é a de definir quem é ou não político.

Para Aristóteles (século 3 AC), por exemplo, em sua famosa obra “A Política”, o homem é um animal político, “o homem é naturalmente feito para a sociedade política”. De fato, lato sensu, política é toda a prática social de mediação de interesses entre indivíduos ou organizações. Assim, se você coloca um outdoor dizendo para não votar em “políticos”, você, queira ou não, está expressando uma opinião política. Se você promete levar sua esposa ao teatro no domingo para que no sábado você possa ir ao estádio, você acabou de fazer uma “negociação” política. Se você participa, concorrendo ou apoiando, uma chapa para o seu Clube de coração, você está fazendo política.

Só não faz política o ermitão e este, para Aristóteles, “seria um indivíduo detestável, muito acima ou muito abaixo dos homens, segundo Homero: um ser sem lar, sem família sem leis”.

Ou seja, para Aristóteles, ou você é um ser divino com poderes sobrenaturais ou é um homem e, portanto, político. Como Deus ainda não se inscreveu para disputar a eleição no Vasco, vamos ter que escolher um ser humano mesmo, com seus defeitos e qualidades.

Tragicamente, mais de 2200 anos depois de Aristóteles, dois personagens surgiram na década de 30 do século passado. Talvez ambos fizessem sucesso hoje em dia no Brasil, pois os dois pregavam “o fim da política” e diziam que “entravam na política para acabar com ela”, eram eles Hitler e Mussolini. Neste ponto Aristóteles deveria ter o direito de reviver e gritar: eu avisei! Vejam se não é profético o que ele escreveu sobre quem pretende acabar com a política: “Aquele que fosse assim por natureza só respiraria a guerra, não sendo detido por nenhum freio e, como uma ave de rapina, estaria sempre pronto para cair sobre os outros”. De fato, a alternativa à política é a tirania, o poder absoluto, o despotismo.

Na verdade, os que dizem não votar em “políticos” (e que também são políticos e, portanto, não votam sequer em si mesmos) querem dizer “não votamos em quem ocupa, já ocupou ou pretende ocupar mandato parlamentar”.

Mesmo esta afirmação, embora mais precisa, é quase tão errada e autoritária quanto a outra: “não voto em político” pois esta última tem como defeito a mais apenas o de ser mais genérica.

Qual é a opção então ao parlamento? Vamos voltar a ter os poderes ocupados por “direito divino”, decreto de um ditador, sucessão dinástica, monarquia absolutista? É certo que o parlamento tem muitos defeitos e que nem sempre são atraídos para a política parlamentar o que há de melhor na sociedade, mas quem acha que a corrupção só existe no parlamento e não existe no mercado financeiro, entre as grandes empresas, no judiciário, nas igrejas e em outros ramos de atividades precisa despertar para a realidade, o mundo é muito mais complexo do que os veículos da mídia tentam nos fazer enxergar, fora o fato de que a corrupção no parlamento – que é grave e precisa ser combatida – aparece mais porque, de todos os poderes o poder parlamentar é, de longe, o mais transparente e exposto e assim deve ser.

Querer defender a democracia combatendo o instituto da representação parlamentar é mais ou menos como trocar a água suja do banho do bebê jogando fora o bebê junto com a água suja.

Nós, do grupo Identidade Vasco, como sabem todos, defendemos para presidente do Vasco o nome do advogado Roberto Monteiro. Com larga história no Vasco, Roberto é advogado há mais de 20 anos e, durante seus 43 anos de vida, em seis destes anos ele exerceu, com dignidade e correção, um mandato parlamentar de vereador.

Roberto Monteiro tem propostas, tem um grupo de importantes nomes do mundo vascaíno a apoiá-lo. Gostar ou não das propostas do nosso grupo ou mesmo do nosso candidato é um direito de cada um e manifestar a preferência ou não por este ou aquele candidato faz parte do jogo democrático. Dizer, no entanto que, “não voto em fulano por ser político” é usar um pobre argumento que revela argumentos pobres em defesa de suas próprias ideias.

É lógico que muitos vão continuar a usar deste arrogante argumento mas, sobre estes uso a frase do poeta francês François Fénelon: “Aquele pensa que sabe muito, mas não sabe de nada, e a sua ignorância é tanta que nem sequer está em condições de saber aquilo que lhe falta”.

Para a imensa maioria da torcida do Vasco que reflete criticamente sobre os assuntos convido: conheça as propostas do grupo Identidade Vasco. Verão, creio eu, que temos o melhor candidato para o nosso Clube e vamos juntos construir uma nova e saudável política para o Vasco, pois sem uma visão política jamais teria existido, por exemplo, “A resposta histórica” (que foi uma avançada atitude política do nosso clube contra o preconceito racial e social) e nem o Vasco seria este gigante que é e que nós, do Identidade Vasco junto com todos os vascaínos, queremos garantir que continue para sempre a ser.

Wevergton Brito Lima é jornalista e sócio estatutário do Club de Regatas Vasco da Gama

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